Um pequeno imprevisto
Essa história começa comigo transando.
Comigo!
Transando!
Eu nem acreditava que isso ia acontecer um dia.
Já tinha amigos com dois filhos quando chegou minha vez de perder a virgindade (tá certo que meus amigos casavam com quatorze anos porque as famílias não toleravam sexo antes do casamento, mas eu já me sentia um velho).
Foi uma sequência de acontecimentos aleatórios.
Se eu não tivesse conhecido um cara na internet, viajado quatrocentos quilômetros de ônibus para conhecê-lo e experimentado pela primeira vez os poderes mágicos da tequila, talvez estivesse virgem até hoje.
Minha mãe aprovaria.
--
Mas essa história não é sobre eu transando.
É sobre quando eu estava voltando pra casa.
Fato consumado, peguei um ônibus de volta e tirei minha primeira soneca como adulto transante.
Acordei com um alvoroço no meio da estrada.
O ônibus parou e as pessoas desceram para ver o que acontecia de tão importante que fez o ônibus brecar com força em plena madrugada fria.
Curioso, desci também.
Bem na frente do ônibus, um carro tinha batido tão feio que ficou parecendo uma latinha de Bavária que um bêbado pisou em cima.
Dentro dele, uma pessoa ainda viva gritava pedindo ajuda.
Não deu tempo dos bombeiros chegarem antes que o carro ficasse em chamas.
As pessoas ao meu redor gritavam desesperadas. A pessoa dentro do carro também dava seu último grito.
Fogo alto, assustador. A madrugada continuava fria.
--
Corri de volta para dentro do ônibus, tirei um caderno da mochila e comecei a escrever.
Estava determinado a fazer alguma coisa fazer sentido no meio daquela maluquice.
Rabisquei, rabisquei e acabei com um poema chamado "Eu, imprevisto". O Imprevisto,em primeira pessoa, falava sobre como era maior que todos nós.
Não coloco aqui porque ficou uma bosta.
Mas também, quem é que consegue escrever direito com gente gritando?
--
No outro dia, procurei notícias sobre o acidente na internet e só achei manchetes como "Dezessete pessoas morrem nas estradas do Paraná durante o feriado".
Aparentemente, nada da cena que me fez perder o sono por um semestre foi importante o suficiente pra virar notícia.
Pelo menos a minha maneira adolescente de lidar com o trauma era mais bonita do que a de hoje. Não consigo mais fazer poemas. Se fosse hoje, provavelmente voltaria ao ônibus tentando contar piadas.
Tive até que me impedir de terminar o parágrafo anterior com uma frase como "Minhas partes ardiam tanto quanto as pessoas no carro".
--
Nada de errado em rir de desgraça.
Cada um tem seu jeito de lidar com o imprevisível da vida.
Porque, Jesus Cristo, se tem uma coisa que a vida consegue ser é imprevisível.
Num dia, você perde a virgindade com um estranho da internet.
No outro, assiste gente morrendo na sua frente sem poder fazer nada.
De repente, mais de uma década se passou e você decide contar a história pra alguém, só pra compartilhar o absurdo e se lembrar do óbvio: nunca se sabe o dia de amanhã.
Comigo!
Transando!
Eu nem acreditava que isso ia acontecer um dia.
Já tinha amigos com dois filhos quando chegou minha vez de perder a virgindade (tá certo que meus amigos casavam com quatorze anos porque as famílias não toleravam sexo antes do casamento, mas eu já me sentia um velho).
Foi uma sequência de acontecimentos aleatórios.
Se eu não tivesse conhecido um cara na internet, viajado quatrocentos quilômetros de ônibus para conhecê-lo e experimentado pela primeira vez os poderes mágicos da tequila, talvez estivesse virgem até hoje.
Minha mãe aprovaria.
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Mas essa história não é sobre eu transando.
É sobre quando eu estava voltando pra casa.
Fato consumado, peguei um ônibus de volta e tirei minha primeira soneca como adulto transante.
Acordei com um alvoroço no meio da estrada.
O ônibus parou e as pessoas desceram para ver o que acontecia de tão importante que fez o ônibus brecar com força em plena madrugada fria.
Curioso, desci também.
Bem na frente do ônibus, um carro tinha batido tão feio que ficou parecendo uma latinha de Bavária que um bêbado pisou em cima.
Dentro dele, uma pessoa ainda viva gritava pedindo ajuda.
Não deu tempo dos bombeiros chegarem antes que o carro ficasse em chamas.
As pessoas ao meu redor gritavam desesperadas. A pessoa dentro do carro também dava seu último grito.
Fogo alto, assustador. A madrugada continuava fria.
--
Corri de volta para dentro do ônibus, tirei um caderno da mochila e comecei a escrever.
Estava determinado a fazer alguma coisa fazer sentido no meio daquela maluquice.
Rabisquei, rabisquei e acabei com um poema chamado "Eu, imprevisto". O Imprevisto,em primeira pessoa, falava sobre como era maior que todos nós.
Não coloco aqui porque ficou uma bosta.
Mas também, quem é que consegue escrever direito com gente gritando?
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No outro dia, procurei notícias sobre o acidente na internet e só achei manchetes como "Dezessete pessoas morrem nas estradas do Paraná durante o feriado".
Aparentemente, nada da cena que me fez perder o sono por um semestre foi importante o suficiente pra virar notícia.
Pelo menos a minha maneira adolescente de lidar com o trauma era mais bonita do que a de hoje. Não consigo mais fazer poemas. Se fosse hoje, provavelmente voltaria ao ônibus tentando contar piadas.
Tive até que me impedir de terminar o parágrafo anterior com uma frase como "Minhas partes ardiam tanto quanto as pessoas no carro".
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Nada de errado em rir de desgraça.
Cada um tem seu jeito de lidar com o imprevisível da vida.
Porque, Jesus Cristo, se tem uma coisa que a vida consegue ser é imprevisível.
Num dia, você perde a virgindade com um estranho da internet.
No outro, assiste gente morrendo na sua frente sem poder fazer nada.
De repente, mais de uma década se passou e você decide contar a história pra alguém, só pra compartilhar o absurdo e se lembrar do óbvio: nunca se sabe o dia de amanhã.
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