A importância de um toque
Histórias de cafuné, parte 01:
Memória de infância.
Eu era pequenininho de tudo, uns cinco anos no máximo, e estava deitado com a minha mãe na cama dela.
Ela fazia carinho no meu nariz, e eu estava em êxtase.
De repente a culpa bateu. Eu só estava recebendo carinho.- que egoísmo! - e ela merecia ganhar também.
Por um segundo, me ocorreu como devia ser horrível ser adulto. Ninguém te pega no colo, ninguém te faz cafuné, ninguém te deixa deitar no ombro e curtir uma preguiça?
Tive um ímpeto de compaixão e decidi que aquela injustiça ia acabar.
Joguei a minha mão com força no nariz dela e comecei a chacoalhar. A coordenação motora fina ainda estava em construção, mas a retribuição foi digna. Eu era um bebê altruísta.
Ela achou graça e depois de um tempo parou de acariciar meu rosto.
Soltei o nariz da minha mãe, agarrei a mão dela e coloquei no meu rosto novamente.
Sem essa de ganhar cafuné de graça pra cima de mim!
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Histórias de cafuné, parte 02:
Teve uma vez em que uma tempestade de bosta atingiu minha vida em cheio e eu simplesmente não dei conta. Eu chorei tanto na terapia, mas tanto, que o meu psicólogo simplesmente sentou ao meu lado, colocou uma mantinha no colo, pediu pra eu deitar e passou as mãos pelo meu cabelo enquanto eu chorava.
Não lembro de um teórico da psicologia que sugira isso, e posso até citar alguns profissionais que falariam que isso é ultrapassar os limites de um atendimento que, a princípio, deveria ser técnico e científico.
Mas era o que bem daquilo que eu precisava naquele momento: um colo e um toque gentil.
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Histórias de cafuné, parte 03:
Outro dia eu fiz uma sessão de Barras de Access. O negócio é basicamente alguém suavemente cutucando partes da sua cabeça e corpo com os dedos em áreas que teoricamente alinhariam suas energias e trariam bem-estar.
Não achei estudos científicos que suportassem a teoria por trás disso, mas achei tão gostoso que voltei para uma segunda sessão. Talvez o negócio me remeta ao cafuné que eu amo receber desde criança.
Pensei até em fazer um curso disso, estudar os tais pontos que devem ser tocados, mas... o ponto a ser tocado é a pessoa.
Um dia eu junto coragem e coloco uma maca na minha sala, não pra fazer uma técnica pseudocientífica que eu convenceria meus pacientes que pode reduzir sua ansiedade, mas... pra fazer carinho mesmo.
Cafuné.
Um descompromissado e carinhoso cafuné.
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Crise de ansiedade? Ok, vamos falar a respeito, vamos fazer a psicoterapia tradicional, e depois deita aqui que eu vou mexer no seu cabelo.
Vou fazer carinho no seu nariz.
Vou lhe dar um ursinho pra abraçar (na real já faço isso, o Molengo é lindo e meu companheiro de trabalho), lembrar de como é bom ser criança e poder se acalmar não porque a razão lhe convenceu que tudo está seguro - mas porque você sente o toque de alguém ali, dedicado a você.
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Talvez nem todo mundo se sinta confortável com isso, então vou deixar a compra dessa maca pra depois.
De qualquer forma, fica a recomendação: ganhe cafunés.
Peça cafunés, você vai se surpreender com quantas pessoas ficam contentes de lhe fazer um carinho.
Se tiver vergonha de pedir, eu tenho bons resultados com a técnica de me esgueirar de fininho e deitar a cabeça no colo da pessoa. O cafuné vem quase instintivamente.
Se possível, faça cafunés também. Se tiver intimidade pra tanto, faça uma massagenzinha no ombro tenso do colega, sem interesse nenhum além de vê-lo feliz, como quando a gente faz carinho numa criança.
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Existe até o Touch Research Institute, da Universidade de Miami, que é uma instituição dedicada apenas a estudar como o toque ajuda a diminuir sintomas de dor em pacientes das mais variadas moléstias. Estudo após estudo indica como um toque amável pode ajudar mesmo em casos de dores físicas intensas e crônicas.
E, vejam só, não custa nada.
Um abraço pra vocês... e um cafuné também.
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