Fora do Globo



Eu sou completamente fascinado pelos símbolos de Natal.
Principalmente no Brasil: nós celebramos uma festa alienígena. Decoramos árvores de plástico baseadas em espécies que não temos por aqui, cobertas de isopor para mimetizar um evento climático que não acontece no nosso país, fazendo uma refeição que não condiz com a temperatura que faz por aqui.

O único símbolo de Natal condizente com o Brasil é o Papai Noel, que é um velhinho que não se aposenta nunca e de quem todo mundo espera tirar alguma coisa.

Mas tem uma quinquilharia de Natal que me fascina mais que todas: sabe aquele globinho de vidro, com uma casa em miniatura dentro, coberta de água, que quando você chacoalha faz cair neve?

Nada a ver com a gente. Se fizesse um globo com o Brasil dentro, o que iria cair do céu seria areia, estrogonofe de frango e vira-latas caramelos.

O globo com neve dentro é um símbolo da fantasia do natal: um lugar cercado, protegido, com tudo em paz e uma neve pacífica caindo suavemente ao seu redor.
Muito mais uma esperança do que o Natal poderia ser do que o que ele realmente é.

Uma imagem completamente irreal.

Talvez um retrato mais adequado do Natal verdadeiro fosse a parte de agitar o globinho de vidro, o globo sendo tremendo vigorosamente na mão de alguém com seus habitantes completamente enlouquecidos dentro dele.

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Deve ser muito triste imaginar que a vida feliz de verdade é aquela de dentro do globo de vidro. Tem muito mais gente fora do globo do que dentro dele, muito mais gente fora do ideal de felicidade natalina do do que dentro.

Seja na família sem grana, exausta de viajar de ônibus, reunidas no fim do ano, fazendo um esforço sobre-humano pra tentar se amar.
Seja sem família, comendo uma pizza congelada e vendo um pornozão no notebook.

Seja num encontro de empresa com o sorriso completamente forçado, fingindo entusiasmo depois de ganhar mais uma garrafa plástica de 19,90.
Seja na portaria de um prédio, trabalhando de plantão enquanto a família come o peru comprado com o seu salário.

E ainda assim, de alguma forma, sentindo amor.

Porque é data de sentir amor, caralho. Jesus morreu por isso. Ou nasceu. Ou foi gay no especial do Porta dos Fundos. Alguma coisa assim.

Bate uma inveja de quem tem um Natal de globinho de vidro, peru e neve? Talvez. Mas aqui tem Itaipava, uva passa e bicho geográfico. Dá pra ser feliz também.

Como diz a caneca de polipropileno made in China que eu ganhei no ano passado: Merrry Crishtmas!


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