Velhos Precoces
Um sintoma menos lembrado da depressão é o pensamento mórbido. Veja, não é vontade de morrer com todas as letras: é a lembrança permanente da mortalidade. Você tá bem na sua, andando no shopping e subitamente lembra que vai precisar ser enterrado com alguma roupa, e quando vê, está com lágrimas nos olhos no meio da Renner pensando que vai morrer um dia.
Cá pra nós, esse não é o único pensamento temático que sinaliza alguma coisa.
Semana passada completei trinta e três anos, e foi aquela onda de piadinhas de "tá ficando velho, hein?". Ficar velho é um tema tão frequente de piadas que dá pra dizer que se trata de uma obsessão da minha geração.
Talvez seja porque fomos muito estimulados à precocidade: começamos a ler muito cedo, fomos cobrados de responsabilidades e de conquistas materiais ainda muito jovens.
Fomos programados para nos sentirmos mais velhos do que somos.
Resultado: os vinte e cinco, começam as piadas com a dor nas costas e com a falta de disposição para atividades que requerem muito tempo em pé.
É uma visão muito porca da velhice, porque a velhice é muito mais do que sentir vontade de sentar quando vai passar horas em um evento. Isso é mero desejo de conforto, natural ao ser humano de qualquer idade. Não é como se as pessoas de dezoito anos quisessem fazer rolês desconfortáveis e longos.
É só que aos dezoito você não tem dinheiro pra outro tipo de lazer, e não vai deixar de aproveitar por conta disso.
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Esse pensamento quase mórbido de "estou velho, hein? kkk" é um sintoma de desesperança. É achar que, um, a velhice é um lugar de decadência, e dois, que a decadência já começou e que não há mais nada a se conquistar.
Mais do que ter dor nas costas, ser velho é mérito.
Um mérito que a gente tenta trapacear quando diz que se sente velho aos trinta e poucos. Tá velho agora? E o que você vai sentir aos 40? aos 60? Você realmente acredita que não vai ter nenhum frio de barriga nos anos que lhe restam?
Querer usufruir da velhice antes da hora é sabotar justamente o que pode ser gostoso nela: viver um trecho de vida sem muita coisa a se provar, podendo se dar a liberdade de fazer o que sempre quis.
E agora repara nos velhos de verdade: estão dando baile na gente. Quem vê um Ney Matogrosso rebolando aos oitenta anos e não quer ser um pouco assim também? Nem precisa ser no futuro, ter aquela saúde hoje já seria excelente.
Outra velha ótima é a Rita Lee, e é dela o trecho que quero usar pra terminar esse texto. Vem de uma música chamada Divagando, do último disco dela:
"O tempo voando
Passando batido no sentido inverso
Do meu universo que segue no espaço
Quanto tempo ainda tenho no mundo?
Eons? Milênios? Milésimos de segundo?"
Não sei, Rita, mas não quero esperar sentado. Ainda tem alguma juventude por aqui.

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