Ambiguamente te amo

Eu me divirto TANTO no Dia dos Namorados com as declarações de amor que deixam transparecer o cansaço dos pombinhos:

"Dia de declarar meu amor por essa pimentinha azeda que me tira do sério como ninguém, minha birrentinha que eu amo tanto", ou

"Feliz dia dos namorados para essa pessoa que eu amo mesmo quando a gente não se acerta, mesmo quando me trai e mesmo quando me deu duas facadas na barriga quando discutimos depois daquele show do Metallica.

É uma carta afetuosa e um puxão de orelha ao mesmo tempo. Arte pura.

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Há quem diga que essas mensagens são sinais de um relacionamento tóxico, mas relacionamentos abusivos e relacionamentos difíceis são duas coisas bem diferentes e é preciso saber diferenciar. 

Que bom que a sociedade chegou num ponto em que estamos atentos aos sinais de toxicidade em relacionamentos, mas o papo é sim um pouco diferente quando se trata de ficar com alguém por bastante tempo.

Já vi bastante gente chegar na terapia com medo de comentar que decidiu dar mais uma chance ao relacionamento depois de uma briga feia.

Mas conhecer alguém profundamente envolve interagir com os - inevitáveis! - aspectos tóxicos daquela pessoa. 

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É no jeito que a pessoa lida com esses aspectos dentro de uma relação que se revela o quanto vale a pena ficar. 

Isso nem sempre vai ser uma decisão fácil, e às vezes, no cuidado para não jogar algo bacana fora, pode acontecer de se tolerar o intolerável até entender bem o que se passa ali.

Mas é natural do jogo: a construção de um relacionamento é coisa difícil e delicada demais pra ser tratada com leviandade.

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Um relacionamento que é só dificuldades é um relacionamento que pode não ser a melhor opção, mas um relacionamento que tem dificuldades, mesmo que grandes... é só um relacionamento. E óbvio, se existe violência, ameaça, chantagem emocional, melhor pular fora.

Agora, é impossível ter qualquer coisa grande na vida sem um pouco de ambiguidade. Ninguém passa 40 anos num emprego sem ter pensado em pedir demissão em algum momento.

Não tem como ficar oitenta anos ao lado de alguém, olhar para a pessoa e falar "Nossa, não enfrentamos dificuldade nenhuma nesses anos!". Não teria nem graça.

Por isso, vou passar de pano para as declarações de amor que deixam escapar um pouco do sufoco que é estar num relacionamento. 

A ambiguidade é inevitável. Decidir ficar, dia após dia, mesmo quando a convivência não é fácil, tem um valor e tanto. Melhor do que fingir que tá tudo perfeito, né? Se existe amor e respeito na maior parte do tempo, há motivos pra comemorar.